terça-feira, 28 de novembro de 2017

"O tempo e a taipa", de Inês Busetti, vence melhor poesia do Enart

Inês Terezinha Busetti,  integrante do CTG Rancho de Gaudérios, da 25ª RT, conquistou pela primeira vez o titulo de melhor poesia do Enart. 

Na velha porteira, à beira do caminho,/ A velha taipa, qual muralha, quase ruína/ Marcada pelo tempo, pelas intempéries,/ Segue açoitada pelo sopro  frio do minuano./ Suas pedras irregulares, roliças, escuras…/ Trazem à mente o tempo de outrora,/ Um tempo de magia, de calma, de rusgas,/ Traçando limites que se vão campo afora”. 

            Assim inicia a obra ‘O Tempo e a Taipa’, que venceu o primeiro lugar na categoria poesia da 32ª edição do Enart. A autora é a professora aposentada Inês Terezinha Busetti, 71 anos, esposa do ex-conselheiro da Fundação Cultural Gaúcha, do MTG, Waldemar Busetti. A inspiração veio de suas próprias lembranças da infância.

            “Me deu saudade, porque meu pai fazia taipas, ele ia com calma e com jeitinho colocando uma pedra junto da outra. É uma parte da história do Rio Grande do Sul e está desaparecendo” – disse Inês, em entrevista à radio Spaço fm, 100.9, de Farroupilha.


O Tempo e a Taipa                           
Flor de Liz

A manhã é fria e debulha o orvalho
Na flor mimosa, que ornamenta o campo,
E o vento Minuano soprando-lhe as folhas
Lançando seu perfume a cada recanto.
Ao longe o sol nascente lança fagulhas
Em cada colina adormecida e calma
E os meus olhos sonolentos e xucros
Embebem essa magia que afaga a alma. 

Essas cores entre verdes e dourados
Tons caprichosamente tingidos pelo sol de inverno
Vão formando esse quadro : “tela campesina”
Tão perfeita obra do “ pintor eterno”.
O divino pincel vai trançando rumos e sina
E nem a rude pedra foge dessa sorte,
A cada passo, lá está ela, serpenteando,
Formando taipas, cruzando de sul a norte.

Na velha porteira, à beira do caminho,
A velha taipa, qual muralha, quase ruína
Marcada pelo tempo, pelas intempéries,
Segue açoitada pelo sopro frio do minuano.
Suas pedras irregulares, roliças, escuras…
Trazem à mente o tempo de outrora,
Um tempo de magia, de calma, de rusgas,
Traçando limites que se vão campo afora.

Se reviverem esses tempos já passados
Ouvirão os cantos plangentes dos negros quebras
Ecoando no ar...lamentos ao vento…
Enquanto põem em seu lugar as pedras
E eles escravos de um tempo desigual
Vão alcançar taipas, mangueiras, muradas
Para durar eternamente demarcando, sinal
Limites de fazenda do patrão, campo e estradas.

Ah! silenciosa e velha taipa!
Recordação do tropeiro tangendo a boiada…
Contando causos, cantando ou floreando gaita.
Tu és testemunha das pendengas do peão,
Dos entreveros, das tropeadas, das reses nas estradas,
Da lida do campeiro, dos pingos altaneiros
A desfilar garboso pela planície e canhadas,
Do amanhecer que alegra o pampa inteiro.


Quantas mãos calejadas, admiraram tuas formas,
E quanto suor, escorreu da pele escura
Do negro, que te erguia do chão,
Para formar esta muralha, que perdura.
Quantas luas se foram desde então…
Tu serviste de abrigo para o rebanho cansado,
Limite para o potro afoito e bardoso,
Pouso para o quero-quero tão alvoroçado.

Ao te ver agora taipa musguenta
Parece-me ouvir ao longe o ranger da carreta,
O canto dolente do índio vago, solito…
Que pelo pampa deixou seus “ recuerdos”
Taipa velha, trilha marcada, serpenteando…
Traço que o vento não apagou,
Sinal de um tempo que se vai ao longe
Legado que o gaúcho no pampa deixou.

Não sei porque quando te contemplo
Meu peito se aperta como se “ chinchado”,
Pelos braços envolventes da saudade.
E minha alma busca trazer versado
Esse sentimento, em singela frase,
Como se pudesse ver o tempo passado, 
E meu olhar saudoso, mirando o infinito,
Agradece aos céus por esse pampa abençoado. 

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