Por Leandro Araújo
Eu não gosto de cebola na maionese! - Para quem não é do Sul, estou falando daquela salada de batatas, que aqui chamamos apenas de salada de maionese. – Simplesmente não combina! A suavidade da batata e a cremosidade da maionese para mim acaba sendo envenenada com o gosto forte e a rigidez da cebola. Respeito quem gosta e quem põe em sua receita, mas peço, por gentileza, que quando fizer uma maionese com cebola, que reserve separado um pouco sem este tempero para mim, obrigado.
Quando mais jovem eu até havia feito uma teoria sobre a cebola na maionese que dizia o seguinte: Se o cozinheiro colocar cebola na maionese, só quem gosta dela na salada vai comer. Se ele não colocar, todos vão comer. Simples assim...
Contudo, eu não desprezo totalmente o vegetal malcheiroso. Gosto de usar para temperar carne, por exemplo. Frito até que quase desapareça, mas uso. Em ensopados também costumo utilizar. Mas na salada de maionese, ou em qualquer outra salada onde ele apareça cru, nem pensar.
Todavia, fico imaginando que grande besta eu seria se ficasse simplesmente desejando o fim da cebola. Óbvio, seria cômodo, porque não precisaria mais me preocupar com ela aparecendo de surpresa e estragando alguma deliciosa maionese. Mas também seria um desejo egoísta, pois não levaria em consideração todas as pessoas que gostam de cebola. Não deixaria de ser, também, uma forma de reprimir a criatividade, uma vez que fico pensando em quantos temperos diferentes foram descobertos apenas porque alguém procurou alternativas à desprezada cebola.
Outro motivo que me faz refletir e não desejar o confortável desaparecimento da cebola é o fato de que existem muitas pessoas que precisam dela para sobreviver. Há famílias inteiras que dependem do seu plantio, que trabalham de sol a sol, que cuidam, adubam, regam. E depois vendem. Também tem o cara que transporta. O que distribui. E o que vende na feira. Ah... e o que pesa na balança. Todos eles dependem, mesmo que em uma pequena parte, da cebola. Então o fato de não gostar dela na maionese, não me dá o direito de querer seu fim sumário, simplesmente porque não tenho o direito de querer o mal de tantas pessoas para favorecer um gosto pessoal meu. Ou seja, não quero comê-la, mas para isto não preciso odiá-la, correto?
O que temos visto nas redes sociais ultimamente é um festival de ódio à cebola. Seja ela cebola política, cebola religiosa ou, até mesmo, cebola esportiva. Pasmem!
Quantas vezes por dia nos deparamos com pessoas, muitas delas amigas nossas, que disseminam o ódio às suas cebolas? Compartilham mensagens e imagens carregadas de preconceito, pregam escancaradamente que aquele que gosta então não deveria comer outra coisa, apenas cebola. Quem sabe até se mandar para outro país onde sua cebola fosse aceita com naturalidade, mas não aqui. Apresentam provas cabais de que a cebola está envolvida em tudo que é de mais ruim no mundo e que por isso mesmo deveria ser erradicada. Com violência, se fosse o caso.
Se um músico se manifestar a favor da cebola: Parem de ouvi-lo agora! Sua música não presta e seu sucesso só se deu porque existe uma fraude na Lei de Incentivo ao Bulbo Vegetal! Não importa o quanto de admiração havia por qualquer pessoa, a partir do momento em que ela resolver defender a cebola, devemos considerá-la burra, corrupta e mentirosa. Devemos questionar não seu posicionamento com relação à cebola, mas sua obra como um todo.
Por outro lado, os contrários, que defendem o tempero, dizem que aquele que não gostar de cebola é covarde, que a única comida verdadeiramente boa é aquela feita com bastante cebola. Vão usar apelidos depreciativos para diminuí-los em sua condição humana. Podem, inclusive, defender que o ideal seria um mundo onde todos fossem obrigados e comer cebola sorrindo e tecendo elogios fervorosos ao Grande Chef que, impecável em sua cozinha, mandaria envenenar a comida de qualquer um que ousasse questionar o sabor e a importância de suas cebolas.
Não vivemos mais no limite da tolerância. Já o ultrapassamos faz tempo. Nossa sociedade está no momento em que a frase “Está comigo ou contra mim?” é perfeitamente natural. Mensuramos o caráter das pessoas não pelo que elas acreditam, mas pelo quanto o que elas acreditam se aproxima do que eu acho certo e aceitável. Em quem se vota, com quem se dorme e até mesmo o que se come é mais importante do que o quanto uma pessoa possa ter feito de bem para outras. Estamos mais próximos das fogueiras inquisitórias da Idade Média do que imaginamos.
Um grande abraço e um ótimo final de semana a todos nós.
TOLERÂNCIA AINDA É A PALAVRA MAIS BONITA DA LÍNGUA PORTUGUESA! #SEJATOLERANTE!
Lê Araújo faz parte do Projeto
Aquecimento Cênico
É fotografo e professor
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