Ativista político e cultural e Brizolista inveterado, lembrou emocionado do encontro com o ídolo por ocasião de uma passagem de Leonel Brizola pelo Alegrete. A paixão pelo político vem do pai, outro fã declarado de Brizola. Aliás, o pai é uma memória constante, já que foi Bagre quem cuidou do patriarca da família. “O Neto era o xodó do meu pai, tanto que, assim como eu, ganhou o nome dele... e o pai dizia que o Neto ainda seria o maior cantor do Rio Grande”, conta. Entre as memórias, relembra uma das profecias do velho Euclides. “Meu pai dizia que tinha duas tristezas na vida, só duas. Quando perguntei quais eram, ele respondeu que uma era não poder ver o Neto cantando na Califórnia e a outra não poder abraçar o Brizola, que estava voltando em seguida (depois do exílio no Uruguai por causa da ditadura). Pois no ano que o pai faleceu (em agosto), em outubro o Brizola veio ao Alegrete e em dezembro o Neto ganhou a Califórnia”, revela.
Bagre e Neto Fagundes no Programa Galpão Crioulo |
Durante a conversa, Bagre relatou como acabou se tornando artista e porque o regionalismo faz parte da sua vida. “Eu fui aparecer em palco como artista, já era homem velho, casado, cheio de filhos e netos. Minha profissão no Alegrete era de bancário. Eu não era de CTG. Aliás, da minha grei, só quem foi de CTG foi o Ernesto, meu segundo filho. Ele foi campeão de chula, malambo, sapateava. Pequeninho – sempre foi pequeninho e é até hoje (risos). É um gaúcho pequeninho! – mas ele se destacou como sapateador. Depois ganhou de presente do tio Nico um bombo leguero e se agarrou no bombo, passou o violão pro Neto, e ficou a formação que tem hoje”.
Ricardo Yuji Fujiwara - Art Director @ Cria Ideias |
Bagre Fagundes, em 1988 |
Sobre o irmão, Bagre tem muitas histórias. Uma, que retrata o sucesso de Darcy e as semelhanças de Neto com o tio, ele faz questão de contar. “O Neto era pequeno e, uma vez, chegando em casa, tinha uma multidão na frente da entrada. Ele se apavorou, achou que tinha morrido alguém, mas não! Era o Darcy que tava na cidade, ia se apresentar à noite no cinema e o povo queria ver ele. Daí o Neto disse espantado: Ah, mas o tio é famoso, hein? Depois disso o Neto passou a brincar com o pessoal da escola e dizia: Não te mete comigo, que sou sobrinho do Darcy Fagundes (risos). O Neto desde pequeno foi metido, brincalhão”, assegura. “O Darcy era a nossa estrela artística, nós todos da família éramos fãs dele. Os cartazes diziam que Darcy Fagundes ia se apresentar e aquilo movimentava a cidade. A chamada dizia: No sindicato Glória, do Alegrete, Darcy Fagundes, Luiz Menezes e sua equipe. Pronto! Aquilo lotava o cinema, o teatro na cidade. Qualquer lugar que eles iam, eles lotavam. Mas porque eles eram muito bons. O estilo, a logística das apresentações agradavam. O neto herdou muito esse lado artista do Darcy – um pouco herdou de mim, mas a maior parte é do Darcy” revela, demonstrando a admiração que tem pelo talento do irmão.
Bagre assegura que o trabalho do irmão foi uma das sementes para o tradicionalismo como conhecemos nos dias atuais. “Não tenho dúvida, nem eu, nem ninguém, que o Grande Rodeio ajudou na divulgação do tradicionalismo. O programa trocou de nome algumas vezes. Começou como Grande Rodeio Coringa, porque ele era patrocinado pela marca Coringa, aquele brim coringa. Depois trocou de nome, quando mudou o patrocínio, aí ele ficou Grande Rodeio Farroupilha. O programa se destacou desde o início, porque ele tinha diversos quadros que chamavam a atenção do público e agradavam, quadros que o Darcy chamava de Invernadas. Tinha a Invernada dos Declamadores, a Invernada dos Trovadores, a Invernada das Duplas, a Invernada Mirim e os quadros variavam conforme o interesse da produção”. Assim como Bagre, muitos nomes consagrados da música regional passaram pelo palco do Grande Rodeio. O programa de auditório era a esperança de muitos jovens talentos que, à época, buscavam na credibilidade e sucesso da atração, a vitrine para a fama.
Ainda conforme o entrevistado, o sucesso do programa era algo extraordinário. “Todo mundo escutava o Grande Rodeio. O programa era uma febre, não só no Alegrete, mas em todo o Rio Grande do Sul e até fora. O pessoal no interior marcava hora e se reunia na casa dos vizinhos que tinham rádio, até porque sempre tinha alguém da terra ou de uma cidade vizinha que ia se apresentar”.
Quadrinho de "Os Fagundes" |
Sobre a dinâmica do programa, Bagre revela que a premiação das atrações era pela popularidade. “O concurso de talentos era pelas palmas. A plateia escolhia pelas palmas. Tem até uma história que virou folclore no programa. Tinha um trovador chamado Luiz Müller, que era cego. O Darcy pagava o cachê das atrações pela presença de público, quando tinha bastante gente o cachê melhorava, quando não tinha tanto, o valor era menor, porque a entrada no auditório da Farroupilha, na Siqueira Campos, era paga. Um dia, depois da apresentação, o Darcy chegou pro Müller e disse: Olha, companheiro, essa noite não foi lá essas coisas. Aí, o Müller questionou: Mas como não? – e o Darcy insistiu que teve pouca gente, mas o Müller, muito esperto, retrucou: Que nada, estava cheio! O Darcy estranhando perguntou: Mas como tu sabe? E o trovador: Ah, pelo volume das palmas! – A história virou causo, o trovador era cego, mas não era bobo, não perdeu pro Darcy” – conta dando boas risadas. O trovador Luiz Muller era responsável por auxiliar Darcy na seleção preliminar antes de cada programa, era assim que, apesar de ser ao vivo, a qualidade das atrações eram mantidas. Geralmente, ficavam apenas dois pra apresentação.
Darcy Fagundes e Dimas Costa no Grande Rodeio Coringa - 1957 Fonte: Revista TV, Porto Alegre, ano 3 |
Bagre destaca que o auditório da Rádio Farroupilha estava sempre lotado. “Não tinha domingo que não estivesse com a lotação completa. Podia cair canivete, que o povo ia ao programa. Era um auditório grande, acho que pra mais de mil pessoas e estava permanentemente lotado”. Ainda sobre as qualidades do irmão, Bagre revela outra faceta do irmão apresentador. “O Darcy só não era artista amador porque pagavam ele, mas se não pagassem, ele ia igual (risos). Ele era esse tipo de artista, entendeu? Já o Nico era muito mais comercial, ele pegou uma outra época de patrocínios e cachê estabelecido. No tempo do Darcy era comum ir se apresentar pela portaria e nem sempre sabiam quanto iam ganhar, mas ele ia de qualquer jeito. Por sorte, eles faziam sucesso”, brinca.
Sobre a parceria na apresentação do programa, que começou com Paixão Côrtes, depois Dimas Costa e, por fim, Luiz Menezes, Bagre considera que a última estava destinada a dar certo. “O Menezes foi o grande companheiro do Darcy, a amizade deles ia além da profissão. Quem apresentou o Menezes pro Darcy foi o Nico, nosso irmão. O Darcy cantava, mas não era um cantor, ele era o homem da poesia, da trova, o homem da conversa. No programa, eles queriam manter o sistema de apresentação em dupla, mas queriam, além do cara da conversa, ter um que fosse da música. Foi aí que a dupla se formou até o final do programa”.
Para o músico, os festivais deram um gás para o Movimento Tradicionalista, que à época, já existia como federação, mas infelizmente, Darcy não chegou a ver o auge dos festivais, morreu logo após o início do sucesso dos festivais nativista, mas viveu para ver o sobrinho Neto Fagundes no palco da Califórnia. Colorado de carteirinha, Bagre faz uma última confissão, pra fazer parte da família, torcer pelo Internacional é pré-requisito. “Quando namorei minha esposa, perguntei pra quem ela torcia, ela disse que não tinha preferência, respondi que por livre espontânea obrigação ela seria colorada a partir de então. E assim é”, graceja antes encerrar.
2 comentários:
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Gostei muito dessas publicações, parabéns a todos envolvidos nesse trabalho!
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